Ariel Bentes; 11/09/2020 às 15:32

A saúde mental em meio à pandemia da Covid-19

No Brasil, cerca de 12 milhões de pessoas sofrem de depressão e o país também é considerado o mais ansioso do mundo

De acordo com os dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), no Brasil cerca de 12 milhões de pessoas sofrem de depressão, sendo a maior taxa da América Latina e a segunda maior das Américas. O país também é considerado o mais ansioso do mundo com 18,6 milhões de brasileiros que possuem transtorno de ansiedade. Além disso, o suicídio é a segunda principal causa de morte entre jovens com idade de 15 a 29 anos, segundo a Organização Pan-Americana de Saúde no Brasil

Foto: Reprodução/Internet

Devido a pandemia do novo coronavírus, que já resultou em mais de 128 mil óbitos e infectou mais de quatro milhões de pessoas no Brasil, a população precisou aderir o isolamento social e indivíduos ao redor do mundo podem sofrer com sérios impactos em sua saúde mental, como afirma Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS. 

“À medida que os impactos econômicos e sociais se expandem, podemos esperar um aumento nas condições de saúde mental, como depressão, ansiedade e transtornos por uso de substâncias. Os profissionais de saúde da linha de frente, confrontados com cargas de trabalho pesadas, decisões de vida ou morte e risco de infecção, são particularmente afetados. O mesmo acontece com crianças e adolescentes, cujas rotinas diárias foram completamente interrompidas. Os idosos, principalmente aqueles que vivem sozinhos, correm risco no isolamento social”, disse Tedros.

Um estudo coordenado por pesquisadores da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) confirma a fala de Tedros. Com o apoio de cientistas do Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM), da universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Federal de São Paulo (Unifesp) e Franciscana (UFN), cerca de 3,6 mil pessoas participaram da pesquisa e 65% delas afirmaram que a sua saúde mental piorou neste período, no qual 46,6% contaram que “piorou um pouco” e 18,4% disseram que “piorou muito”. 

Mesmo com este quadro, 67,5% dos entrevistados informaram não fazer tratamento psicológico e 15,4% afirmaram ter interrompido as consultas devido à quarentena. Somente 11,7% declararam manter sessões online e 5,4%, presenciais.

“A amostra não é representativa da população como um todo, mas ajuda a entender o que se passa em um estrato específico da sociedade. Nós já esperávamos que haveria essa percepção de piora. Quando o questionário foi aplicado, fazia apenas um mês que havia começado o distanciamento social. Foi uma fase de maior estresse, em que as pessoas precisavam se adaptar”, disse Vitor Crestani Calegaro, coordenador do projeto e psiquiatra do HUSM, ao jornal Gaúcha Zero Hora.

Essa piora na saúde mental dos brasileiros também pode ser observada através das redes sociais. Um levantamento feito pela ComunicaQueMuda (CQM), plataforma digital da agência nova/sb que tem como objetivo propor debates sobre temas considerados polêmicos, constatou que posts publicados no Twiter, Instagram, Facebook, RSS e Youtube que mencionam o suicídio tinham como sua principal conexão o isolamento social. A pesquisa também apresentou um expressivo aumento nas menções ao tema este ano, pois em 2017, a taxa era de 6,3% e em 2020, passou para 23,5%

Para Manuela Gomes, estudante de psicologia e diagnosticada com depressão no ano passado, a primeira reação à pandemia foi de susto. “Fiquei com muito medo de perder entes queridos ou pessoas próximas. Foi um desafio adaptar minha rotina – que antes consistia em passar a maior parte do tempo fora de casa – com o isolamento social”, disse ela. 

Manuela também disse ao Portal mercadizar, que não ter mais contato com pessoas próximas foi uma das partes mais difíceis da quarentena. Neste período, a estudante voltou a fazer terapia, dessa vez através de videochamada, e buscou praticar atividades como, por exemplo, yoga, desenho e exercícios físicos, para que ela pudesse expressar os seus sentimentos e alcançasse um equilíbrio emocional. 

“O momento da pandemia com certeza afetou grande parte da população e acredito que pela primeira vez as pessoas tenham entrado em contato consigo mesmas e percebido que o isolamento social trouxe consequências para sua saúde mental. Com certeza esse período contribuiu para que a sociedade prestasse mais atenção ao autocuidado, não apenas físico, mas também psíquico”, afirmou Manuela.

Com a designer Paula Costa, o momento não foi muito diferente. Em entrevista, ela relatou a sua experiência com o isolamento social: 

“Na primeira semana em casa passei o tempo todo de pijama, dormindo até tarde e desanimada com a vida. Na segunda, decidi que ia mudar e aproveitar esse tempo para focar em mim. Comecei a me exercitar, ter momentos de introspecção, investir em redes sociais e na minha loja. Consegui passar a maior parte da quarentena nessa fase ‘saudável’, mas agora no início de agosto eu passei por duas semanas em que estava transicionando entre um emprego e outro, além de cuidar da minha loja e vida no geral. Eu estava com tantas preocupações ao mesmo tempo que acabei tendo crises de ansiedade e também de depressão. Para completar, eu também não falava com a minha psicóloga desde abril e isso bateu muito forte. Me afastei do que pude para poder me recuperar aos poucos. Agora já estou melhor, mas voltei a me consultar e acho que se tivesse continuado com a psicóloga talvez não tivesse recaído tanto’’, contou Paula.

Os profissionais de saúde são particularmente afetados

A situação é ainda mais tensa com os profissionais de saúde que estão na linha de frente no combate ao coronavírus. Em abril deste ano, o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) realizou inspeções em 5.780 unidades de saúde do país e constatou um alto nível de afastamento de enfermeiros por suspeita de covid-19. Além do Confen, a Associação Paulista de Medicina (APM) ouviu cerca de 2.312 médicos no Brasil e 86,6% afirmaram que a categoria está apreensiva e deprimida.

Já em maio, a Fundação de Vigilância em Saúde (FVS-AM) apontou, que até aquele momento, Manaus tinha para 1.279 profissionais de saúde confirmados com coronavírus. Dessa forma, representando 5,5% dos mais de 23 mil profissionais de saúde da cidade na rede pública e privada. Em agosto o Ministério da Saúde (MS) divulgou em entrevista coletiva, que 257 mil profissionais da saúde foram infectados pelo vírus no Brasil. O país também contabiliza 226 mortes, sendo 38,5% auxiliares de enfermagem, 21,7% médicos e 15,9% enfermeiros. 

Rodrigo Maciel**, enfermeiro do Hospital 28 de Agosto em Manaus, uma das principais unidades na cidade que atende os infectados, é um dos profissionais que viu essa realidade de perto. “O meu psicológico está muito abalado, pois perdi muitos amigos de trabalho para esse vírus e outros tem se afastado para evitar a contaminação. A situação ainda não é boa e tenho pena da população, ainda mais quando a saúde é mal administrada como está sendo nesse momento”, disse ele ao mercadizar. 

A psicóloga Raquel Castro, conta que com a pandemia tem recebido novos pacientes da área da saúde e que é perceptível um sofrimento e um impacto emocional forte na vida desses profissionais. Isso acontece devido o convívio diário com a ideia da morte, o temor de contrair a doença e ainda tem o afastamento social. Eles lidam com essas situações e ficam privados de ter relações sociais, principalmente com a família. É uma solidão enorme’’, disse ela. 

O caso de Luciana Paes, enfermeira da Maternidade Ana Braga, é semelhante ao de Rodrigo*. Ela declara que profissionais da saúde sempre conviveram com episódios de alto estresse e isso se agravou com a pandemia. “Diante do cenário atual esses fatores se exacerbaram. O estresse, sobrecarga de trabalho, pressão, necessidade de adaptação e o medo de adquirir e transmitir o vírus a familiares é diário”, explicou.  

Além disso, Luciana complementa o seu relato falando sobre a perda dos colegas de trabalho. “A situação que nos deparamos de perda e adoecimento de colegas, gera um desequilíbrio em nossa vida.  O luto, apesar de ser um processo natural, não estamos preparados para lidar com ele. O que nos acalenta e nos motiva a continuar na luta, é lembrar da dedicação e o amor que esses colegas tinham pela enfermagem. Continuamos por nós, pelos que se foram, por aqueles que se recuperaram e, principalmente, pelos que necessitam dos nossos cuidados”. 

Neste momento pandêmico e em todos os outros, é fundamental cuidar da saúde mental. Ao mercadizar, Raquel falou sobre algumas maneiras de manter o equilíbrio emocional: 

“Você pode ter esse afastamento físico, mas você pode manter as relações emocionais. Converse com pessoas importantes para a sua vida diariamente, mesmo que virtualmente. Isso é essencial para que você consiga manter viva as suas relações e não se sentir isolada. Se você estiver trabalhando de casa, é preciso também tentar manter uma rotina, uma organização do dia, se manter ativo, não precisa estar sempre trabalhando, mas fazendo coisas que voltem positivamente para você. Esse também é o momento de ser solidário com as pessoas e ajudar o outro que está em uma situação difícil”, disse a psicóloga. 

Raquel também destaca a necessidade de se buscar ajuda profissional. “Diariamente, eu ouço pessoas dizerem que depois que assistem ou leem notícias sobre a pandemia tem vontade de chorar. É preciso estar ciente que tem dias que você acorda bem, mas vai ter dias que isso não vai ocorrer. Por isso, é necessário estar atentos a esses sentimentos e o momento que esse medo vira sofrimento, é o momento de você procurar ajuda. Quando você está equilibrado psicologicamente, a gente vai ter lucidez para todas as decisões e isso quer dizer mais consciência para nos proteger e evitar situações de risco”, afirma ela

Abaixo, confira uma lista com seis psicólogas que oferecem o serviço de forma virtual. Além disso, clique aqui e veja o post de Karen Mabel, influenciadora digital, com atendimentos psicológicos gratuitos em Manaus. 

Laena Portela

@laenaportela

laenaportela@gmail.com

Raquel Castro

@raquel_psi

(92) 98159-3414

Danielle Cristhie

@danielle_cristhie.psi

(92) 98411-9867

Marly Paixão

@marlypaixaopsi

marlypaixao@ymail.com

Lara Ezaguy Avelino

@psi.laraavelino

Laís Soares

@psilaissoares

Ana Caroline Ferreira

@psi.anacarolinefdr

**Rodrigo Maciel é um nome fictício usado para preservar a identidade do profissional.

 

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