Sofia Lourenço; 01/08/2024 às 16:50

Ricardo Kaate Lima une ancestralidade amazônica e ficção especulativa em ‘A Lança de Anhangá’

Publicada pela editora Cachalote, o livro explora mitos e lendas amazônicas através de uma narrativa que mistura ficção científica, fantasia e horror

O livro “A Lança de Anhangá”, publicado pela editora Cachalote, é uma coletânea de contos especulativos que mistura ficção científica, horror e fantasia, tendo a Floresta Amazônica como personagem central. 

Imagem: Divulgação

Na obra, o escritor e doutor em Ciências Sociais Ricardo Kaate Lima imagina um cenário onde seres da ancestralidade mitológica da Amazônia se vingam das violências do capitalismo predatório que destrói as reservas naturais da região. O livro está disponível no site da Aboio.

Com uma narrativa que transita entre investigação noir e terror fantástico, a obra destaca a luta de povos indígenas contra a devastação ambiental e em 2022, venceu o Prêmio Literário Cidade de Manaus na categoria Arthur Egrácio.

No conto que dá nome à obra, o investigador Heitor, em um Brasil autoritário, se envolve em uma investigação sobre o tráfico de crianças indígenas. Ele encontra Anhangá, um espírito ancestral que pune aqueles que cometem crimes ambientais e violam direitos humanos. Junto com a jornalista Nadja Paim, Heitor descobre um dossiê sobre os crimes na região e, após um incidente, torna-se um vingador da humanidade.

Ricardo Kaate Lima retrata a riqueza cultural da Amazônia e as dificuldades enfrentadas pelos povos tradicionais diante da devastação ambiental, autoritarismo e ganância corporativa. Anhangá e Heitor simbolizam a luta contra as consequências da modernidade, corrupção e opressão, destacando a resistência e resiliência da cultura amazônica.

O livro é também um grito de esperança na busca pela autonomia dos povos indígenas e pelo reconhecimento de sua espiritualidade como parte essencial para a libertação dos povos da Amazônia. 

Imagem: Divulgação

Ricardo Kaate Lima: A voz amazônica na ficção especulativa

Ricardo Kaate Lima, nascido em 1984 em Manaus e atualmente residente em Manacapuru, é mestre e doutor em Ciências Sociais pela Unesp. Ele é professor no Instituto Federal do Amazonas – Campus Manacapuru e lidera o Grupo de Pesquisa Educação e Ciências Humanas na Amazônia. 

Como escritor, venceu o Prêmio Literário Cidade de Manaus na categoria “Melhor Livro de Contos” em 2022 e já contribuiu para diversas antologias de ficção especulativa. Lima começou a escrever aos dezoito anos para combater a depressão e é um estudioso apaixonado pela cultura amazônica.

Kaate expressa um profundo vínculo com sua terra natal, a Amazônia, e destaca a importância de sua identidade regional em sua obra literária. Como autor e pesquisador da região, ele utiliza o rico legado cultural e histórico amazônico para explorar temas sombrios e complexos. 

“Eu sou, acima de tudo, um amazônida falando sobre a minha região, escrevo sobre o que conheço. Antes de ser brasileiro, sou amazônida”, declara Ricardo. 

Ele compara os mitos amazônicos com as obras de Stephen King e H.P. Lovecraft, enfatizando que a história da região, assim como a de toda a América Latina, está marcada por traumas, violência e dominação.

“Resolvi aproveitar o rico legado da história e da cultura amazônica para falar dos medos, fobias, monstros e toda sorte de desgraças que podem acontecer conosco. Algumas já estão acontecendo”, ressalta. “Os mitos amazônicos são tão assustadores quanto as histórias de Stephen King ou os Deuses Exteriores de H.P. Lovecraft. Os mitos, relatos, folclore, cosmologia e causos, tudo espelha ou é um reflexo da história sangrenta na periferia do capitalismo ocidental.”

Abordar também sobre a possibilidade de outros mundos, civilizações e universos seduz o autor sob o ponto de vista estético.

“É uma forma de refletir sobre esse mundo terrível e ao mesmo tempo fugir dele. Criticar as mazelas do mundo, mas também escapar dele. Eis porque misturo tudo que li e pesquisei sobre essa Sibéria tropical em vias de desaparecer, que é a minha região, com o horror cósmico, a dark fantasy, a ficção científica, o solarpunk e o cyberpunk”, justifica.

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