Há muitos anos, o mundo passa por um processo de degradação ambiental. Entre as principais consequências estão fenômenos que prejudicam e impactam diretamente a existência de vida no planeta Terra, como o derretimento das calotas polares, chuvas intensas e a desertificação. No Brasil, a situação ambiente é preocupante, principalmente nos últimos quatro anos.
Diante de índices alarmantes, o meio ambiente precisa de atenção e dedicação. Por isso, existe uma legislação específica e diversos órgãos fiscalizadores do meio ambiente nas três esferas do poder público. “É muito importante que o Estado tenha políticas voltadas ao Meio Ambiente, para que sejam traçadas metas específicas, não somente para o combate aos crimes ambientais, mas antes de tudo, voltadas à prevenção, ao planejamento e à conscientização da sociedade”, afirma Carla Biaggi, Delegada Titular da Delegacia Especializada em Crimes contra o Meio Ambiente e Urbanismo (Dema).
As políticas ambientais brasileiras tiveram início na década de 1930, com a criação de parques nacionais localizados em pontos onde ocorriam expansões agrícolas e processos de desmatamento, entre eles o Parque Nacional de Itatiaia, o Parque de Iguaçu e a Serra dos Órgãos. Além disso, foi elaborado, em 1934, o primeiro Código Florestal Brasileiro para regulamentar o uso da terra com o objetivo de preservar a natureza.
No entanto, por conta do processo de industrialização e expansão territorial a partir da década de 1950, as políticas ambientais foram deixadas de lado e, consequentemente, os avanços estagnaram. Na década de 1960, algumas ações foram realizadas, com destaque para a promulgação do Novo Código Florestal Brasileiro, em 1965, que estabelecia alguns novos direcionamentos, como a criação de APPs (Áreas de Proteção Permanente) e a responsabilização dos produtores rurais sobre a criação de reservas florestais em seus terrenos.
Em 1986, a Lei 7.511/86 modificou o regime da reserva florestal que permitia o desmatamento de 100% da mata nativa, desde que substituída por plantio de espécies, inclusive exóticas. A partir de então o desmatamento das áreas nativas não foi mais permitido. Os limites das APPs foram expandidos dos originais 5 metros para 30 metros (contados da margem dos rios) e, para rios com 200 metros de largura ou maiores, o limite passou a ser equivalente à largura do rio.
Três anos mais tarde, a Lei 7.803/89 determinou que a reposição das florestas nas reservas legais fosse feita prioritariamente com espécies nativas. O limite das APPs nas margens dos rios voltou a ser alterado, com a criação de áreas protegidas ao redor de nascentes, bordas de chapadas ou em áreas em altitude superior a 1.800 metros.
A partir de 1996, o Código Florestal passou a ser modificado por diversas Medidas Provisórias, a última em 2001, MP 2166-67. Neste período, o Código também foi modificado por um dispositivo relacionado, a Lei de Crimes Ambientais (lei n.º 9.605/98). Diversas infrações administrativas viriam a se tornar crimes e a lei permitiu ainda a aplicação de multas mais pesadas pelos órgãos de fiscalização ambiental, além de criar novas infrações.
Apesar do disposto em lei, o Código e as ações eram poucas para um país com a extensão do Brasil. Para atender à demanda, o governo criou a Secretaria Especial de Meio Ambiente (SEMA), que girava em torno da preservação do meio ambiente e da manutenção dos recursos naturais no país. A criação abriu espaço para novos órgãos, como o Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA), o Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) e um órgão voltado para a fiscalização, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA).
Desde a década de 1990, houve uma forte e continuada pressão pela flexibilização do Código Florestal de 1964 por parte das entidades de classe representantes dos grandes proprietários rurais. As discussões levaram à proposta de reforma do Código Florestal, que tramitou por 12 anos na Câmara dos Deputados e gerou polêmica entre ruralistas e ambientalistas.
O Código Florestal, Lei 12.651/12, está em vigor desde maio de 2012, mas a sua implementação ainda dá os primeiros passos. Muitos dos seus dispositivos ainda dependem de regularização e da criação dos instrumentos para que sejam eficazes.
O anti-Ministro do Meio Ambiente
No dia 28 de outubro de 2018, Jair Bolsonaro, à época no Partido Social Liberal (PSL), foi eleito presidente do Brasil. Tanto em seu plano de governo, quanto nos debates e eventos durante o período eleitoral, poucas foram as discussões sobre as políticas ambientais do então candidato. Logo, ambientalistas demonstraram preocupação com seus posicionamentos sobre temas como os desmatamentos dos biomas brasileiros, a crise sanitária na qual estão inseridas as cidades brasileiras e a atuação do governo na política ambiental internacional, principalmente no que tange às mudanças climáticas.
Após décadas de evolução e consolidação na área ambiental, o governo de Jair Bolsonaro já se confirmou como o de maior desconstrução da política de proteção ambiental brasileira. Além dos discursos que incentivam a exploração das áreas ambientalmente protegidas do país e que ampliam a permissividade aos infratores, o governo atua firmemente para afrouxar leis e sucatear órgãos de preservação ambiental.
Uma das principais bandeiras defendidas por Bolsonaro no combate a “velha política” – sob a qual se elegeu – era a de enxugar o número de ministérios. Antes de sua eleição, a promessa era que um dos ministérios que perderia seu status seria o do Meio Ambiente, transformando-se em uma pasta dentro do Ministério da Agricultura. No entanto, devido a rápida e estrondosa repercussão negativa dessa decisão na sociedade e mídia brasileiras, o governo, mesmo a contragosto, manteve o MMA.
No dia 02 de janeiro de 2019, tomou posse o advogado Ricardo Salles, tornando-se Ministro do Meio Ambiente. Salles já havia atuado na gestão pública ambiental, quando foi Secretário do Meio Ambiente de São Paulo de julho de 2016 a agosto de 2017, na gestão de Geraldo Alckmin. O curto período à frente da pasta ocorreu devido a inquéritos relacionados à improbidade administrativa do Instituto Geológico e da Área de Preservação Ambiental da Várzea do Rio Tietê, pelo qual foi condenado em primeira instância.
O nome de Salles gerou diferentes reações. Ambientalistas e cientistas criticaram a escolha do Presidente por entenderem que o mesmo não leva em consideração aspectos técnico-científicos. Por outro lado, movimentos ruralistas apoiaram a decisão, defendendo a “modernidade, eficiência e integração entre diversos setores”.
Quando assumiu a titularidade da pasta, Salles deixou claro que sua proposta era conciliar ruralistas e ambientalistas a fim de reduzir conflitos do MMA com o setor produtivo. Somente no primeiro ano do ministro à frente do Ministério do Meio Ambiente, o Brasil assistiu ao desmonte de órgãos de fiscalização e gestão, aumento recorde de queimadas e desmatamento, distanciamento das ONGs ambientais, exonerações em massa, extinção de conselhos, perda de órgãos para outros ministérios, o fim do Fundo Amazônia e a péssima repercussão internacional.
“É importante frisarmos que a agenda ambiental brasileira nunca foi central para a agenda dos grandes partidos políticos e nem dos governos. Claro que tem um ou outro governo que se inclina, ao menos, a não perturbar muito a luta ambientalista, mas, no geral, eu não vejo que houve, em algum momento, uma vontade de minar o processo de exploração e desflorestamento da Amazônia. Nunca foi uma agenda muito persistente dos governos brasileiros. Mas, agora, essa agenda de destruição acelerou. Já na campanha eleitoral, eles afirmavam que não haveria Ministério do Meio Ambiente, que reestruturariam o ICMBio e que todas as políticas que visavam mitigar a exploração destrutiva da Amazônia e da Mata Atlântica seriam revistas. E é o que eles vêm fazendo”, afirma Luiz Fernando de Souza Santos, sociólogo e professor do departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Amazonas (Ufam).
Durante reunião interministerial ocorrida em 22 de abril, cujo vídeo foi divulgado na íntegra por decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello, o ministro do Meio Ambiente, sugere, em fala vergonhosa, que o governo federal aproveite o momento em que a imprensa e a sociedade estão voltadas à pandemia de coronavírus para mudar regras de proteção ambiental, evitando, assim, questionamentos.
Salles cita o foco dos veículos jornalísticos na pandemia: “Nós temos a possibilidade nesse momento que a atenção da imprensa está voltada quase que exclusivamente pro Covid, e daqui a pouco para a Amazônia, o General Mourão tem feito aí os trabalhos preparatórios para que a gente possa entrar nesse assunto da Amazônia um pouco mais calçado, mas não é isso que eu quero falar”, afirmou.
“A segurança jurídica, da previsibilidade, da simplificação, essa grande parte dessa matéria ela se dá em portarias e norma dos ministérios que aqui estão, inclusive o de Meio Ambiente. E que são muito difíceis, e nesse aspecto eu acho que o Meio Ambiente é o mais difícil de passar qualquer mudança infralegal em termos de infraestrutura, é instrução normativa e portaria, porque tudo que a gente faz é pau no judiciário, no dia seguinte”, disse o ministro.
“Então pra isso precisa ter um esforço nosso aqui enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de Covid e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas. De IPHAN, de Ministério da Agricultura, de Ministério de Meio Ambiente, de ministério disso, de ministério daquilo. Agora é hora de unir esforços pra dar de baciada a simplificação, é de regulatório que nós precisamos, em todos os aspectos”, continuou.
Depois da divulgação do vídeo, o ministro se “justificou” em uma rede social. “Sempre defendi desburocratizar e simplificar normas, em todas as áreas, com bom senso e tudo dentro da lei. O emaranhado de regras irracionais atrapalha investimentos, a geração de empregos e, portanto, o desenvolvimento sustentável no Brasil”, disse Salles.
O ministro não apenas falou, em meados de abril, que era uma “boa oportunidade” para a flexibilização das leis ambientais, como botou em prática. Nos últimos meses, foram várias as tentativas de afrouxamento da legislação ambiental e, muito ao contrário do que Salles imaginou, as medidas tomadas pelo Ministério foram, sim, alvo da imprensa:
- 06/04: Anistia a desmatadores de áreas da Mata Atlântica;
- 14/04: Exonerações e enfraquecimento no setor de fiscalização do Ibama;
- 22/04: Funai permite ocupação e venda de terras indígenas não-homologadas;
- 07/05: GLO para combater incêndios e desmatamento ilegal na Amazônia Legal;
- 12/05: Reestruturação e enfraquecimento do ICMBio, permitindo que pessoas externas assumissem gerências, o que facilitou o processo de “militarização” dentro dos órgãos;
- 20/05: Tentativa de aprovação apressada do Projeto de Lei 2.633, que facilita a grilagem e a entrega de terras públicas para criminosos que querem avançar com o agronegócio sob nossas florestas
De acordo com Lucas Ferrante, biólogo, pesquisador e doutorando em Ecologia do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), a ação intencional de Salles em sucatear a legislação e os órgãos ambientais brasileiros está demonstrado em um relatório técnico publicado na Environmental Conservation, revista da Universidade de Cambridge, e também em artigos da revista Science escritos por ele e sua equipe.
“Toda ação que ele [Salles] vem propiciando não é de um Ministro do Meio Ambiente. Nós já o denunciamos há algum tempo por improbidade, ele não está cumprindo o trabalho dele. Tem estimulado o desmatamento na Amazônia e tem tentado simplificar a legislação de todas as formas, aproveitando, inclusive, uma pandemia em que o Brasil é o segundo país do mundo com mais casos, com todo o caos formado na Amazônia, para tirar os holofotes dele”, afirma Lucas.
Como era de se esperar, a fala de Salles repercutiu rapidamente no Brasil e no mundo. Após a divulgação do vídeo, diversas entidades e personalidades da classe ambientalista repudiaram as falas do ministro. No entanto, apesar das barbaridades, as falas e ações não foram surpresa e, agora, mais do que antes, há provas concretas de que o ministro deve ser investigado. “A classe ambientalista já vinha lutando há muito tempo por conta do desmonte da pauta ambiental. Eles não se surpreenderam com esse discurso do Salles porque, na prática, é isso que a pauta ambiental tem enfrentado nesse governo. Eles desmontaram o ICMBio, desautorizaram os processos de fiscalização, abriram as porteiras das terras indígenas para a entrada do garimpo ilegal, a Mata Atlântica e a Amazônia queimam milhares de hectares diariamente… O movimento ambientalista só confirmou e conseguiu um material sólido para mostrar que ele não pode ser o Ministro do Meio Ambiente do nosso país”, avalia Luiz Fernando de Souza Santos.
Através de nota, o Greenpeace Brasil repudiou as falas do ministro: “Um Ministro de Meio Ambiente, condenado por improbidade administrativa, que usa o sofrimento e a morte das vítimas da pandemia para avançar de forma violenta com uma política de destruição e de forma deliberada, dolosa e declarada, e atenta contra a própria pasta não tem moral para ocupar o mais alto cargo ambiental do país que abriga enorme porção da maior floresta tropical do mundo”, afirma a carta.
Na mesma linha, um comunicado da ONG WWF Brasil expressa a indignação da entidade com a “estratégia de destruição do arcabouço legal de proteção ao meio ambiente no Brasil evidenciada pela fala”. “Não é surpresa que o ministro Ricardo Salles venha trabalhando, desde o início de seu mandato, para fragilizar as regras e as instituições criadas para defender nosso patrimônio ambiental. Não por acaso 2019 foi o ano com maior desmatamento na Amazônia em uma década, e os números deste ano mostram que vamos superar essa marca”, diz o texto.
A WWF Brasil afirma, ainda, ser “notória a paralisia administrativa no ministério e nos órgãos a ele associados” e descreve como chocante “sua intenção de aproveitar a maior tragédia econômica e sanitária em muitas gerações, uma pandemia que já resultou em dezenas de milhares de vidas perdidas, para, em suas palavras, ‘passar a boiada’”.
O Observatório do Clima, por sua vez, afirma que o vídeo revela “um ministro de Estado declarando sua intenção de destruir o meio ambiente no país aproveitando-se de uma catástrofe que parou o Brasil e mata dezenas de milhares de brasileiros”.
“As consequências da manutenção de Salles no cargo serão gravíssimas para o país. A revelação do objetivo do governo e do método de destruir regulações ambientais expõe ainda mais o Brasil, cuja economia já vinha abalada antes da pandemia. Elimina de vez nossa credibilidade internacional, cria risco para investidores e amplia a perda da nossa capacidade de fazer negócios. Em resumo, a política anti ambiental de Jair Bolsonaro e de seu ministro nos custa, além de degradação ambiental, empregos e vidas”, finaliza.
Através de seu perfil oficial no Twitter, a ativista sueca Greta Thunberg criticou a fala do ministro brasileiro. No post, ela cita uma das frases ditas por ele e reage: “Imagine as coisas que foram ditas fora da câmera… nosso futuro comum é apenas um jogo para eles. #SalvemAAmazônia”.
Os impactos na Amazônia
Para Ricardo Salles, o desenvolvimento da Amazônia é a melhor forma de proteger a floresta, que vem sofrendo aumento recorde de queimadas e desmatamento no último ano. Em entrevista ao jornal norte-americano Wall Street Journal, o ministro do Meio Ambiente argumentou: “A Amazônia não é apenas um zoológico para ser observado”. Em seguida, complementou que o plano do governo é desenvolver indústrias de mineração e outros segmentos na região. “Há mais de 20 milhões de pessoas vivendo na Amazônia que precisam sobreviver”.
Ao invés de cumprir com exigências de um dos cargos mais importantes do país, tendo em vista que o Brasil detém a maior biodiversidade do planeta, a política adotada por Salles fez com que o desmatamento da Amazônia, por exemplo, voltasse a bater recordes. Segundo dados do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), o desmatamento na região em abril de 2020 foi o maior dos últimos 10 anos, com a marca de 529km² de floresta derrubada. O aumento foi de 171% em relação ao mesmo período de 2019.

Ainda de acordo com Imazon, 32% da área desmatada está localizada no Pará. em seguida, os estados com maiores taxas de desmatamento são Mato Grosso (26%), Rondônia (19%), Amazonas (18%), Roraima (4%) e Acre (1%).
Considerando o período de janeiro a abril de 2020, o desmatamento acumulado é de 1.073 km², representando um aumento de 133% em relação ao mesmo período do ano passado, quando o desmatamento totalizou 460 km². Em abril, a maioria (cerca de 60%) do desmatamento ocorreu em áreas privadas ou sob diversos estágios de posse. O restante foi registrado em Unidades de Conservação (22%), Assentamentos (15%) e Terras Indígenas (3%). A organização alertou também para o desmatamento em terras indígenas, que são os mais vulneráveis à covid-19.
A política antiambiental do atual governo tem resultado no aumento expressivo do desmatamento da Amazônia, da violência no campo e da ameaça direta aos povos indígenas.
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