Os desafios da criação publicitária na pandemia

Com quase um ano e meio de pandemia é indiscutível que houveram mudanças permanentes em nossos hábitos de consumo, que consequentemente mudaram as formas como as mensagens do meio social passam a ser transmitidas para nós.

Repensando nossas prioridades, muitas coisas do mundo se adaptaram para o ambiente virtual e mais pessoas conectadas ocasionaram em novas formas de conquistar os consumidores, mas, para que as marcas chamassem atenção em meio a tantas outras, foi necessário muito planejamento e diferencial das agências publicitárias.

Segundo o estudo Inside Advertising, da Kantar Ibope Media, os investimentos em publicidade no Brasil alcançaram R$ 11,2 bilhões no primeiro trimestre de 2021, e comparado ao valor registrado no mesmo período do ano passado, é possível perceber uma queda de 1,2%. A baixa se dá devido aos impactos da Covid-19 em setores de turismo e automotivo.

“A primeira coisa pensada foi numa crise geral para as agências de comunicação, porque o perfil das empresas em Manaus, assim como a maioria no resto do Brasil, é de dispensar a agência quando uma crise aparece”, afirma Ariadine Ribeiro, coordenadora de mídias da agência Nine Digital.

Entretanto, o setor de telecomunicações foi um dos que teve alta. A pesquisa realizada pelo Interactive Advertising Bureau (IAB Brasil), em parceria com o instituto Nielse, divulgou um estudo sobre os impactos da Covid-19 no investimento em publicidade no Brasil. Dos 167 entrevistados, entre anunciantes, agências, Ad Techs, veículos e outros, 50% afirmaram que já estavam completamente digitalizados em seus negócios mesmo antes da pandemia.

Mesmo com essa crescente, criar conteúdo durante esse período não foi tarefa fácil, ainda mais em reuniões que antes eram presenciais para o melhor entendimento e passaram para o virtual, afastando aquele lado mais pessoal das conversas.

Desafios com as marcas e com o lado profissional 

“A publicidade em si está em constante mudança, agora imagina no meio de uma pandemia em que você deve buscar soluções para não impactar tanto as vendas dos clientes ao mesmo tempo em que você não consegue tirar o pensamento de estarmos vivendo numa pandemia”, conta Ariadine.

O mesmo pensamento é compartilhado por Nayá Costa, responsável pelo atendimento e direcionamento criativo no planejamento da agência VR Studios, o contato virtual influenciou consideravelmente na produção das peças.

“A pandemia em si foi um desafio em diversos aspectos, mas quando se trabalha com publicidade, a união de várias mentes faz a diferença. Estar isolada me fez, por várias vezes, perder o traço criativo. Tive vários bloqueios e até hoje tenho em relação a criação em si”, conta.

A comunicação, devido a pandemia, agora era outra e além de tentar se manter no visor dos internautas, também era preciso ter mais afeto nas palavras e mensagens passadas. A marca ainda precisa vender o produto, mas também não pode se abster da situação delicada que muitas famílias enfrentam, e o novo desafio aos publicitários era de equilibrar essas informações.

“Com todo mundo em uma situação tão angustiante, foi um desafio criar conteúdo para os clientes de forma afetuosa e mais humanizada. Além disso, em algumas situações, informar sobre a situação do estado, país e mundo foi necessário, e nesses momentos é difícil fugir de polêmicas. Então eu vejo toda a criação publicitária da pandemia como uma balança, em que em um lado tem as preocupações, e no outro as obrigações, e a gente tenta buscar o equilíbrio nesse meio”, afirma Nayá.

Além das peças publicitárias voltadas para a marca/negócio, as agências também tomaram, em alguns casos, a função de reprodutores das medidas essenciais de combate à pandemia. “Tivemos que fazer muitos materiais de comunicação enfatizando os cuidados que as lojas estavam tendo, horários reduzidos, informativos de mudança na compra/retirada de produtos ou que determinada loja não vai funcionar e por aí vai”, lembra Ariadine.

Publicidade Digital

Junto com as preocupações sociais e outras redes sociais tomando popularidade no meio, a conexão virtual e o tempo a mais para algumas pessoas acabou por ocasionar uma grande viralização de conteúdos que foi, em alguns momentos, a chave para se manter entre os mais comentados e reprodutores dos memes que mais fazem sucesso.

Dentro da telecomunicação, setor em alta na publicidade, um dos setores com grande crescimento foi o de vídeos sob demanda, que incluem serviços de streaming como Netflix, Prime Video e Paramount+. Segundo os dados da Kantar, os investimentos voltados para essa área cresceram 151% no primeiro trimestre de 2021 em comparação ao mesmo período de 2020.

O sucesso da vez foram os vídeos, seja de Youtube, TikTok ou Reels, só em 2020, segundo o Ibope: 99% dos internautas assistiram vídeos em diferentes telas e dispositivos. No total, 204 milhões de brasileiros assistiram a vídeos por meio de redes sociais, TV, plataformas de streaming, lives e até vídeo chamadas.

Porém, reproduzir memes relacionando-os ao perfil da marca ou criar um novo viral nem sempre é fácil visto que, além de poder perder a popularidade antes da peça ficar pronta, alguns conteúdos podem possuir pontos sensíveis para certos grupos de pessoas. Para Nayá Costa, essa foi uma realidade bastante percebida.

“Trabalhamos no backstage de tudo que sai na internet, mas nem sempre significa que estamos dando risada de cada meme que compartilhamos. O caso da ‘pifaizer’, por exemplo, foi um dos principais virais no país, e de início muita gente deu risada, mas quando a gente para pra pensar que essas vacinas poderiam ter salvado a vida de milhares, isso pesa, sabe? Tem um pouco de dor e angústia em tudo que fazemos, mesmo que não pareça”, conta.

Mas também não podemos esquecer que com a internet também foi possível perceber outras realidades e dificuldades e assim possibilitar a ajuda para quem não estava sendo atendido pelas autoridades competentes, como comenta a coordenadora Ariadine.

“Da mesma forma que algo negativo viraliza, vimos muitas coisas boas viralizarem, como por exemplo, as ações que aconteceram das pessoas se unindo para ajudar outras mais necessitadas. Assim como vimos pessoas não respeitando a quarentena, se recusando a usar máscara, aglomerando sem necessidade no auge da pandemia… A internet possibilitou vermos o melhor e o pior das pessoas”, complementa Ariadine.

Publicidade antes e durante a pandemia

A publicidade praticada antes da pandemia, assim como muitas pessoas, está diferente da atual. As agências agora possuem itens a mais em suas elaborações, além de apresentar o produto e o porquê de se comprar, mostra a importância de uma agência para momentos de descontração e de sensibilidade.

“Sinto que a publicidade antes da pandemia era deixada em segundo plano, quase que a última opção para muitas empresas. Com o isolamento, a internet foi o que restou para todos venderem, e nem todo mundo tem facilidade com o digital. Ganhamos ainda mais espaços e nos tornamos ferramentas essenciais para qualquer pessoa, marca ou empresa”, afirma Nayá.

Também como responsável envolto na produção, Ariadine compartilha do mesmo pensamento ao afirmar que agora o marketing ganhou um valor maior para as empresas, e que dificilmente será deixado de lado novamente.

“Hoje elas perceberam que não podem ficar sem. Não é à toa que a maior procura por profissionais em tráfego pago aumentou consideravelmente. Isso mostra que finalmente as empresas abriram o olho para essa questão, apesar de as empresas ainda se manterem na forma de comunicação mais conservadora”.

A era digital começou, mas está em constante mudança. Durante a pandemia, a internet se fez mais presente do nunca e as produções publicitárias não puderam parar mesmo com os criadores também vivendo momentos difíceis e com o emocional abalado.

O conceito de criação e engajamento é diferente para a publicidade produzida antes da pandemia e atualmente. As adequações para esse cenário novo não foram fáceis, mas também não irão parar tão cedo. Em breve, as agências irão lidar com uma publicidade pós-pandemia, demonstrando que os desafios nesse meio, assim como em alguns outros, é frequente, mas agora um pouco mais valorizado do que antes.