#MercadizarEntrevista: A Amazônia sob o olhar de repórteres de destaque
No Dia do Repórter, conheça profissionais premiados por trabalhos voltados às diversas realidades da maior região do Brasil
“Uma boa reportagem é capaz de fazer isso: levar o leitor para o ambiente, apresentar os problemas e, se possível, apresentar caminhos de soluções”. É assim que a repórter paraense Emily Costa lista algumas das qualidades de uma boa reportagem. A profissional é uma das jornalistas de destaque do Norte por sua atuação na cobertura de temas relacionados à Amazônia.
Inserido no mesmo campo jornalístico, Daniel Nardin, é responsável pelo veículo nortista mais premiado de 2024: o Amazônia Vox. Para ele, “o jornalismo deve ser medido mais pelo impacto que pode causar na sociedade e menos com os números de audiência,” o que reflete nas produções de jornalismo de soluções desenvolvidas e premiadas pelo Amazônia Vox.
Arte: Mercadizar
Neste Dia do Repórter, o #MercadizarEntrevista traz os relatos dos dois paraenses, considerados alguns dos jornalistas mais premiados do Norte do Brasil. Com produções que usam o trabalho de campo como meio de entrar em contato direto com histórias e problemas sociais que impactam a região, os comunicadores contam ao Mercadizar os desafios e a importância do fazer jornalístico na Amazônia.
Destaque nacional e internacional
Em 2024, os repórteres paraenses Daniel Nardin e Emily Costa – entre outros nortistas – entraram no ranking de jornalistas mais premiados do ano, produzido pelo Portal dos Jornalistas. Além disso, o Amazônia Vox, idealizado por Nardin, foi o veículo mais premiado da região Norte, segundo o mesmo ranking.
Imersos nas diversas realidades presentes na região, os dois comunicadores têm diversos aspectos em comum: a atuação em temas relativos à Amazônia, apurações jornalísticas aprofundadas, contato direto com comunidades tradicionais da região, entre outros.
Autora da reportagem “Para jovens migrantes venezuelanos em Roraima, drogas, ouro e morte prematura”, Emily Costa – em conjunto com Mariana Rios e Rodrigo Chagas – investigou o cenário roraimense cercado por problemas como migração, garimpo ilegal, tráfico de drogas, meio ambiente e terras indígenas. A matéria compõe o projeto Amazon Underworld, desenvolvido pelo InfoAmazonia e vencedor da categoria “Produção Jornalística em Multimídia” do 46° Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos.
“É importante para dar visibilidade no mercado, mostrar seriedade e o profissionalismo que executamos na nossa iniciativa, reforçar que existem muitos profissionais com alta capacidade na região. O Amazônia Vox, sendo uma iniciativa daqui, traz visibilidade para outras iniciativas locais do nosso território. Esses são alguns dos ganhos”, afirma Nardin em relação ao reconhecimento dado pelas premiações.
Créditos: Jennifer Bandeira
Para Emily Costa, as premiações renderam emoção em saber que o trabalho teve, entre os diversos resultados, o reconhecimento jornalístico.
“Foi uma emoção muito grande ver o projeto sendo premiado. Quando fomos receber o Prêmio Herzog, eu sentei no banco e comecei a chorar. Chorei durante todo o começo da entrega da premiação porque é muito emocionante ver um projeto sair do papel, ser executado e fazer parte disso com todas as dificuldades que a gente tem de realizar atividades em campo. Tudo isso foi muito bom. A gente ganhou o Prêmio Herzog no Brasil e o Prêmio Gabo. Foi um fruto que a gente colheu por um trabalho de muitos anos, que vai além do Amazon Underworld”, afirma a repórter.
Imagem: Acervo pessoal (Emily Costa)
Os desafios das reportagens
Contar histórias nem sempre é tão simples. O caminho percorrido até que uma reportagem seja publicada muitas vezes é extenso e envolve uma série de técnicas e estratégias jornalísticas que esbarram em desafios.
Para as duas matérias assinadas por Daniel Nardin, o principal desafio foi superar a desconfiança sobre o trabalho jornalístico. Era necessária a aproximação com as comunidades envolvidas nas apurações.
“Acho que o principal desafio é mostrar e conquistar a confiança das pessoas de que a perspectiva que seria mostrada seria além do problema: seria também o problema, e a solução”.
Imagem: Acervo pessoal (Daniel Nardin)
Segundo o jornalista, outro desafio era ter muita certeza dos dados e fazer a correta checagem. Durante a abordagem dos temas, foi necessário também o cuidado ao contar as histórias de outras pessoas.
“Foi mais trabalhoso no sentido de que é uma reportagem aprofundada e que você tem que ter muita sensibilidade para apresentar as histórias, as pessoas envolvidas, e não repetir estereótipos ou repetir narrativas. E sim mostrar que existe um problema, mas que as pessoas estão genuinamente preocupadas em resolver”, destaca.
Para Emily Costa, os desafios estavam relacionados à sua segurança em campo.
“Nesse caso do projeto Amazon Underworld, a gente olhou pro tema das facções criminosas. Eu investiguei na região Norte a questão do aliciamento de jovens venezuelanos para facções que atuam, inclusive, nos garimpos. Então você tem uma interseção desses temas todos num cenário de zero segurança, de muita pressão. Essa parte da segurança é o que mais me preocupa. Tanto me preocupou no Amazon Underworld quanto me preocupa no dia a dia do meu trabalho”.
Imagem: Acervo pessoal (Emily Costa)
Além da manchete
A responsabilidade dos profissionais de imprensa é gigante em toda a sua atuação. Tudo o que é publicado chega a um ponto em comum: a sociedade. E o fazer jornalístico impacta diretamente as dinâmicas sociais.
“Foi muito importante a gente ter esse impacto na matéria do pré-natal com esse projeto de lei que determina maior atenção para mulheres ribeirinhas no sistema de saúde. E foi também solicitada uma audiência pública no Congresso Nacional, que deve ainda ser marcada, mas já está solicitada e aprovada pela Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados para tratar também sobre a questão da saúde pré-natal em comunidades ribeirinhas na Amazônia”.
Desenvolvendo seu trabalho a partir do jornalismo de soluções, Nardin busca abordar problemas ou temáticas a partir da perspectiva de respostas ou soluções.
“Na matéria do pré-natal, a gente trouxe o dado preocupante de que 95 das 100 cidades ou municípios do Brasil com os piores indicadores de cobertura pré-natal adequada – que são sete ou mais consultas – estão na Amazônia. Esse dado estaria pronto. É uma manchete. É uma denúncia. É um fato relevante. Mas nós fomos um pouco além e mostramos o que está sendo feito em comunidades ribeirinhas para que esses números pudessem melhorar ao longo dos anos”.
Ilustração: Thai Rodrigues (Amazônia Vox)
A abordagem de problemas sociais, a pesquisa e o levantamento de dados permitem que investigações jornalísticas exponham possíveis soluções úteis a diversos ambientes.
“É importante para que outras comunidades se espelhem nesse aprendizado, ou aprendam com esse conhecimento para reproduzir a solução sem cair nos mesmos erros que outros já superaram ou não. A sensibilidade, o respeito e cuidado com a informação e as falas permitiram essa aproximação. E, nos dois casos, depois das publicações das matérias, a gente teve retornos muito positivos das comunidades e das lideranças, agradecendo pelo trabalho e pela seriedade com que as informações são repassadas”, acrescenta Nardin.
No caso do Amazon Underworld, o projeto resultou em um banco de dados que permite mapear a presença de grupos armados em fronteiras amazônicas. O projeto é composto por uma série de reportagens aprofundadas sobre vários aspectos do crime organizado da região, muitos dos quais tiveram pouca ou nenhuma cobertura da mídia.
Para Emily Costa, participar do Amazon Underworld rendeu bastante colaboração e aprendizado com todos os envolvidos na produção do projeto. “Foi incrível pra mim poder colaborar com jornalistas de várias partes do mundo. É um projeto que envolve 37 jornalistas de 11 países”, destaca.
A estrutura das matérias e os recursos utilizados na apresentação das informações também foram importantes para a visibilidade alcançada.
“Uma boa reportagem hoje também precisa ser multimídia. Então precisa ter captação de imagens, áudio, vídeo. O Amazon Underworld foi muito premiado por conta da parte multimídia. Fizemos um mapa das facções operando na região e o tipo de negócios que elas operam. Então acho que essa combinação traz uma boa reportagem: dados, personagens, histórias, ouvir as pessoas, buscar ouvir soluções ou pelo menos caminhos para essas soluções”, afirma Emily.
Créditos: Amazon Underworld (Reprodução)
Além dos relatos sobre a participação no Amazon Underworld, Emily Costa também contou ao Mercadizar sobre outra reportagem marcante em sua carreira. Durante a pandemia, Emily investigou o paradeiro de corpos de bebês indígenas Yanomami que foram sepultados sem o consentimento das mães.
“Minha missão em Roraima era encontrar onde estavam os corpos desses bebês que não morreram de Covid, mas foram sepultados rapidamente como se estivessem com Covid em plena pandemia. Para fazer esse campo, tive que ir ao cemitério, ao Instituto Médico Legal, em ambientes não muito agradáveis, sobretudo para uma mulher”, descreve.
De acordo com Emily, a reportagem fez o caso ganhar grande repercussão. “E, pela Amazônia Real, a gente localizou onde estavam estas crianças, que estavam sepultadas em um cemitério privado em Boa Vista”, relembra.
Este é mais um exemplo de como reportagens impactam as comunidades tradicionais na Amazônia. Com olhares atentos sobre a região, Emily e Daniel mostram como o trabalho jornalístico tem suma importância para os debates e para o conhecimento público das causas que afetam a sociedade, meio ambiente e economia amazônica.
*O Mercadizar não se responsabiliza pelos comentários postados nas plataformas digitais. Qualquer comentário considerado ofensivo ou que falte com respeito a outras pessoas poderá ser retirado do ar sem prévio aviso.
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