Patrícia Patrocínio; 07/02/2022 às 13:00

A falta de fiscalização no turismo de natureza 

O turismo envolvendo a natureza é um dos segmentos mais procurados no Brasil

O Brasil é um país de dimensões continentais e conhecido mundialmente por muitos aspectos, mas especialmente por abrigar belezas naturais em uma grande variedade de biomas presentes em seu território. Por essa diversidade de opções, o turismo envolvendo a natureza é um dos segmentos mais procurados no país. 

Segundo o Ministério do Turismo, o Brasil foi o destino escolhido por cerca de 19 milhões de estrangeiros nos últimos três anos. De acordo com relatórios da instituição, o ecoturismo (ou turismo ecológico) foi o motivo de viagem de 18,6% desses turistas. No último ano, por conta da Covid-19, esses números reduziram e o setor paralisou quase totalmente, voltando a se aquecer com crescimento do interesse das pessoas pelo contato com natureza (após meses de  confinamento), o progresso da vacinação e afrouxamento das medidas de segurança. 

Acontece que essa retomada teria tudo para ser muito boa para o setor, se não fosse pelo fato dos últimos acontecimentos envolvendo turismo de natureza revelarem aspectos negligentes por parte dos órgãos que deveriam fornecer procedimentos básicos de fiscalização para controlar os riscos dessas atividades. 

No início da tarde de 8 de janeiro de 2022, 10 pessoas morreram e 32 ficaram feridas no desabamento de rochas em um cânion de Minas Gerais. A zona onde as embarcações estavam com as pessoas costuma ter uma intensa atividade turística. As investigações foram iniciadas e continuam sem um laudo conclusivo, a expectativa é que ele fique pronto entre 30 a 40 dias, mas ainda não há previsão confirmada.O levantamento está sendo realizado em três frentes diferentes para apurar os fatos com focos distintos, os órgãos responsáveis pelas investigações são: a Polícia Civil de Minas Gerais, Ministério Público de Minas Gerais e a Marinha. 

A Polícia tenta descobrir, principalmente, as causas do desabamento que provocou as mortes, enquanto o MP tenta buscar explicações por parte da prefeitura de Capitólio, para saber se o município tinha informações sobre o perigo iminente e se existia algum mapeamento de áreas de risco e planos em situação de desastre. Já a Marinha analisa os aspectos sobre a segurança das navegações. Além dessas investigações está sendo realizado pela Polícia, paralelamente, um levantamento que busca analisar um possível vínculo entre a obra para a construção de mirante e o desabamento de parte do cânion no lago de Furnas. 

Em São Paulo, dias antes da tragédia em Capitólio, um Coach subiu com cerca de 60 pessoas, o Pico dos Marins, um dos mais altos do estado, com uma trilha complexa e com histórico de mortes, prometendo “códigos que destravassem a mente”. Parte do grupo desistiu ao longo do caminho, apenas 32 pessoas permaneceram na subida, mas tiveram que ser resgatadas pelos bombeiros. Segundo as equipes, o resgate foi acionado por volta das 2h30 depois que o grupo teve barracas arrastadas pela ventania e as pessoas ficaram molhadas, sob risco de hipotermia – à noite no pico a temperatura chega perto de 0°C.

 Seguido por mais de 2 milhões de pessoas, Pablo Marçal usou uma rede social para alegar que a intervenção dos bombeiros foi feita por precaução, em contrapartida a corporação contestou informando que o Corpo de Bombeiros não faz trabalho de precaução, eles agem em situações de emergência.O Pico dos Marins é um ponto turístico e muito procurado para a prática de montanhismo.

Em entrevista para o podcast “O assunto” do g1, Luiz Del Vigna, diretor-executivo da Associação Brasileira das Empresas de Ecoturismo e Turismo de Aventura em seu diagnóstico relacionou os casos com a falta de cuidado dos próprios viajantes, a situação de informalidade de muitos profissionais do setor e, principalmente, a falta de fiscalização sobre a legislação vigente.

Escute o episódio abaixo:

Com tanta beleza natural fica difícil não tirar uma selfie, não é mesmo?

Por outro lado, um dos perigos que vem crescendo nos últimos anos e que já deveria ser motivo de alerta por parte dos órgãos do turismo é a exposição a riscos que  turistas se submetem atrás de registrar a selfie perfeita. Um estudo conduzido pela Fundação espanhola IO, apontou que o Brasil ocupa o 5º lugar no Ranking dos países com os maiores registros de mortes por selfies em viagens de turismo. 

Na região norte, em 2017, um artista plástico morreu ao tentar tirar uma fotografia no alto da serra em Tocantins, ele teria se desequilibrado ao fazer uma selfie e caído de uma altura de 70 metros. No ano seguinte, uma equipe do Corpo de Bombeiros em Presidente Figueiredo, passou duas semanas buscando o corpo de uma turista que despencou de 12 metros após tentar tirar uma selfie. Além desses acidentes, a mídia registra casos com frequência de acidentes em lugares de turismo natural. 

Como mudar isso?

Um dos grandes problemas na legislação brasileira é que ela atua de maneira onde é preciso acontecer uma tragédia para depois serem discutidas e sancionadas leis que protegem e previnem mortes e acidentes. Por exemplo, para lei, as inspecções e estudos de riscos só precisam ser realizados em áreas urbanas, não há determinação que obrigue estudos de riscos ou vistorias em áreas remotas. Somente após a tragédia do Capitólio, que o Ministro do Turismo, Gilson Machado Neto, informou que o Serviço Geológico do Brasil identificou mais de 400 áreas onde há risco. Esses monitoramentos, previsões e acompanhamentos são fundamentais para prevenir acidentes naturais como o que ocorreu em Capitólio. É mais que necessário, é urgente que a mentalidade daqueles que constituem o poder legislativo comecem a pensar de maneira preventiva. 

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